Cangaço
Bernardo Ramos Quinteto
R005 | julho 2019
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Itiberê Zwarg, cuja Orquestra Família é acontecimento dos mais radicais da música instrumental brasileira, disse o seguinte: “Acompanho Bernardo Ramos desde 1997, então conheço bem as capacidades rítmica, harmônica, melódica e interpretativa que seu talento abrange – e digo que são ilimitadas.”
O maestro fala do jovem que, ao longo de dez anos, empunhou a guitarra em sua orquestra, com ela gravou três discos e se apresentou nas mais importantes salas de concerto do Brasil e demais países da América Latina. Seria impossível, no entanto, descrever esse instrumentista e compositor carioca como mero epígono de Itiberê – o que, diga-se de passagem, não seria pouco.
Se os sons de seu mestre e de Hermeto Pascoal, o mestre do mestre, estão de fato no DNA de seu próprio som, não se pode dizer que o jazz, Toninho Horta, Egberto Gismonti e Heraldo do Monte o influenciaram menos; tampouco o violão clássico (em que se graduou), as distorções do rock, as peças orquestrais ou mesmo outros campos da cultura.
Ouçamos o primeiro álbum autoral de Bernardo, Cangaço, lançado em 2019 aqui na Rocinante. Há ali mudanças bruscas de andamento, seções contrastantes, “sustos” de toda espécie recriando a atmosfera abrasiva e crispada à qual o título se refere. Tais procedimentos, embora traduzam muito do que ele aprendera escutando seus herois musicais, devem igualmente à admiração que nutre pela radicalidade de certo cinema e à visão aguerrida que tem do Brasil.
Em entrevista para a revista digital Arte Brasileira, o artista afirma que os filmes de Glauber Rocha e David Lynch são determinantes para sua busca por “um estranhamento que seja também um êxtase” e revela que concebe seu ofício como uma tomada de posição neste “constante estado de crise ou guerra” em que nosso país se meteu. “Essas obras me permitiram mostrar meus dentes, são as minhas armas. É preciso lutar.”
Nesse Cangaço, escoltado por Beth Dau (voz), Bruno Aguilar (baixo), Felipe Continentino (bateria), Rafael Rocha (trombone) e Joana Queiroz (participação especial nos clarinetes), Bernardo faz um amálgama de categorias que costumam ser entendidas de modo dicotômico (“composição/arranjo” e “acompanhante/solista”).
Tal organicidade já ficara clara em trabalhos seus anteriores, como por exemplo a trilha do espetáculo teatral de 2005 Capitães da Areia, composta em parceria com ninguém menos que Naná Vasconcelos (e indicada ao Prêmio Shell); os álbuns Bamboo e Abertura (respectivamente de 2010 e 2012, ambos do grupo Bamboo, o quinteto que formou com Aguilar, o pianista Vitor Gonçalves, o saxofonista Josué Lopez e o baterista Alex Buck) e o disco Gesto (gravado em trio com o pianista Rafael Martini e a mesma Joana para o selo japonês Spiral Music em 2016).
A propósito, entre as parcerias firmadas pelo guitarrista na Itiberê Orquestra Família, uma das mais profícuas tem sido com Joana: ele fez parte do sexteto com que a clarinetista gravou Uma maneira de dizer (2012) e Boa noite pra falar com o mar (2016) e foi diretor musical do Inventos, grupo de sopros que ela integrava.
O mergulho de Bernardo nos temas instrumentais, cuja profundidade lhe rendeu a vitória na edição de 2009 do Festival Instrumental de Guarulhos, não o impede de se espraiar na canção popular brasileira, como quando arranjou e produziu Toda pessoa pode ser invenção (disco de Fernanda Gonzaga em homenagem ao pai Gonzaguinha) e foi o arranjador e diretor musical do concerto em homenagem aos 70 anos de Dori Caymmi, com participação do próprio, dos irmãos Nana e Danilo e de Joyce Moreno.
Pelo que já descrevemos – e nem mencionamos as colaborações com Arismar do Espírito Santo, Idriss Boudrioua, Nenê, Rafael Vernet e outros mais – , quando o assunto é Bernardo Ramos, tudo parece estar dizendo: “Itiberê tem razão”.